UMA PROJEÇÃO MORTÍFERA
(Para iniciados e iniciandos, letras mortas para profanos)
A projeção do tempo foi (e continua sendo) veneno terrível, a alimentar a visão canhestra que os homens tiveram e ainda continuam tendo, primeiro a primazia a um eu-personal, depois, a ambição de posse de terra, evidenciando, destarte, flagrante desobediência ao comando divino derramado sobre abrão. Até que se entende que este tenha assim consumado o intento divino, saindo de terra e de parentela, porém o histórico que se fez prevalecer foi o da existência de uma terra de verdade como terra, distante, onde se nasceu e se viveu e dela se saiu para se instalar em outra distante daquela – uma terra onde mana leite e mel… Essa projeção temporal foi seguindo, foi seguindo, até os dias e os últimos momentos desse hoje que todos os vivos da vida abundante vivemos. Nessa lógica, torna-se vã a visão correta, a visão consoante com a visão divina, por meio de um homem encarnando o divino, como Filho deste divino. É que, em sua vida e missão, Ele efetivamente saiu da terra e da parentela que o faziam do mundo, correspondendo ao dizer do Gênesis sobre o sair da terra e da parentela a sua seguinte assertiva que se pode ler em Lucas, Capítulo 14, versículo 26: “Se alguém deseja seguir-me e ama a seu pai, sua mãe, sua esposa, seus filhos, seus irmãos e irmãs (parentela), e até mesmo a sua própria vida (terra) mais do que a mim, não pode ser meu discípulo”. Os homens e mulheres de hoje, e não se pode ter noção de quantos dos anos seguintes em quantidade de muito mais ainda, perdurarão na cegueira de sua parentela e de suas terras, verdadeiras amarras a cegá-los, caindo todos na mesma cova que os tornam apegados a um deus, deus grafado assim mesmo com letra inicial minúscula de suas ânsias de gorduras de egos inflados em eus-personais, ciosos de que possam ser o centro, enquanto terra, e também o centro, como parentela, assim olvidando o comando divino já explicado alhures. Se é o bramanismo e o budismo, fazem estes dos homens como os de posição sentada, perdidos em meditações; se é o islamismo, torna os homens em posição de submissos; se é o judaísmo, são os homens em posição de marcha numa incessante busca por um messias; se é o cristianismo, a posição ereta de quem, deitado da morte, se alevanta para uma ressurreição. Todavia, não se largam, em nenhuma dessas orientações religiosas, seja da terra, que são, seja da parentela, que têm. Até quando, tempo? Até quando? Se o cristianismo é a afirmação de um mundo de terra e de parentela que passa pela negação desse mesmo mundo de terra e de parentela, as palavras de Jesus, segundo Lucas, conforme transcrita, se perdem no emaranhado de um apego a amarras do mundo que sempre fica na contramão de qualquer negação delas. Também o negar não há de se restringir ao completo abandono e negação delas. Seria uma convivência, um sentido de pé no chão, sabido que ambas são as responsáveis pelo ser, ou seja, a encarnação é necessária tanto como terra como parentela. No entanto, por ser imprescindíveis por si mesmas, imprescindíveis se tornam igualmente como elementos necessários à compreensão do não-ser de uma ressurreição. Umas hão de estar atreladas a outras, ainda que provisoriamente, como importância passageira, jamais como importância final.