LIVRE DE ENGANOS

LIVRE DE ENGANOS

(Para iniciados e iniciandos, letras mortas para profanos)

O Eu no meu mim fazer coisas? Eis o mal da abordagem de uma linguagem humana. Coitada dessa linguagem! Personificar lhe é uma tônica, uma constância, uma necessidade. Veja-se: “Não relembreis coisas passadas, não olheis para fatos antigos. Eis que eu farei coisas novas, e que já estão surgindo” – Isaías Capítulo 43, versículos 16-21 e “Ninguém põe vinho novo em odres velhos, senão, o vinho arrebenta os odres, e perdem-se o vinho e os odres. Mas, vinho novo em odres novos!” – Marcos, Capítulo 2, versículo 22). Ora, nem coisas nem querer que somente lhe sejam. Pobre desse lhe, passageiro, finito. O eu, minúsculo, em …“eu farei coisas novas” é, sim, esse finito, esse passageiro de que falo. O “ninguém”, também. Por isso não está grafado com letra inicial maiúscula, assim: Eu. Só o “ninguém”, por conta de uma regra gramatical. Tu, então, profeta, com letra inicial minúscula, vens de um tempo distante, e em rolos e em livros, e em rolos e em livros e em rolos e em livros e, mais modernamente, no eletrônico das novidades que aqui me trazem este conforto de te teres comigo, não sei, neste meu corpo, como receptor de limite limitado dos teus dizeres, mas, sabe-o a divina vontade, que não te permite adentrares o céu da continuidade não somente tua, mas de um povo teu, tão somente com “o-teu-de-uma-propriedade-somente-tua” podendo ser. Desligo-te, não este meu pobre mim, que aqui dialoga com o teu pobre ti nessa longa viagem de tantos milênios e de tantos séculos, e anos, e meses, e dias, e horas, e minutos, e segundos, e de frações deles; desligo-te. A continuidade não é, não pode ser de sangue, de uma hereditariedade, orgânica, de uma cadeia de “deeneas”, genética, portanto. Mas é o sentido de poder que pode com onipotência, com onipresença, com onisciência. A linguagem divina, portanto, não se liga a coisas, nem a novos, nem a novas, nem a velhos, nem a velhas. É o que na indimensão de eterno e de infinito traspassa o ontem, o hoje e o amanhã; não fora assim, se não falaria em infinito, se não falaria em eterno. Falo, então, da mencionada continuidade onde o Profeta e o Evangelista assumem-se maiúsculos, sem qualquer expressividade existencial; e, mesmo assim, sem essa expressividade, riem-se dos profetas e dos evangelistas minúsculos, tão plenos de limitada ex-istência. Pode se falar de coisas, e pode se falar de novas, e pode de falar de velhos, e pode se falar de velhas, porém para a carne, seja a minha, do hoje, do agora, como pode ter sido a de ontem, a de um Napoleão, ou a de um pedinte qualquer de movimentada rua de Paris, ou mesmo de uma cidadezinha inexpressiva, como poderá ser a de um terráqueo privilegiado de daqui a uma centena de milhares de anos a viver nesta mesma Terra que ora lhe pisam estes pés deste reles cronista, doriel. O profeta e, não, o Profeta, prende-se a uma realidade limitada, de tempo e hereditária, e consanguínea, genética e, por isso, fala em coisas e as classifica de novas e as classifica de velhas. O Profeta (maiúsculo), livre de coisas e de novidades, faz não quais profetas e evangelistas, que se prendem a coisas e a novas e a velhas, tanto que, no caso destes últimos mencionados, evangelho quer dizer isso mesmo: novidade! Ambos, então, ficam grafados na expressão diminuta de minúsculas letras que lhe introduzem nomes; nomes, esses substantivos que o vulgo não dispensa ao conhecer perigoso de um perigo de disputa com Deus, anulando, por isso e destarte, o próprio deus de sua imaginada criação, coitados! Preferíveis, em senda de iniciados e de iniciandos, o Profeta e os Evangelistas maiúsculos do constante de eternidade e do ilimitado do infinito. Esses se dispensam inclusive dos próprios substantivos dos quais não se largam – não podem nunca se largarem mesmo – os aprisionados de uma limitada ex-istência, de uma epifania tão pouca e tão pobre. A continuidade que importa, conquanto inexistente, mais do que Profeta, e mais do que Evangelho, e mais do que Evangelistas, reflete numa descendência mais numerosa do que as estrelas do céu, e independe de rins e de corações e de enfezados intestinos, tomados de sentidos que se presumem igualar-se e de se confundirem com Deus, infinito, eterno, eterno, infinito, infinito, infinito, eterno, eterno! Assim, livre de enganos, dispenso-os, personagens, vocês são tantos, tantos, de um colorido de ações santas, separadas, assim se diz, numa linha de hereditário tronco que se firma e se afirma no curso do tempo, ilusoriamente cometendo a tração e a atração de muita gente, aliás, um peso enorme carregado dos sentimentos os mais diversificados e muitas vezes tolos. É que, no lugar do hereditário, uma linha de continuidade se faz, a linha de uma fidelidade divina, a linhagem que é de espírito, em espírito, por espírito, dissociada de sangue e de sofrimento, conquanto estes marquem uma presença acidental, jamais essencial. Nessa linha e nessa linhagem, o Eu, infinito, eterno, ri de tudo quanto se rege pelo signo de coisa, seja nova, seja velha, seja vinho, seja vinagre, a continuidade, entretanto, mostrando-se sem amostras ao visível que chega com a pressa de sentidos e sentimentos, os rins, os corações e os enfezados intestinos, esse grandioso mar contagiante do ser de insustentável leveza, falsamente se diz. Então, entre o adão do jardim primevo, passando pelo adão mais recente do derredor do citado jardim, nascido agora, neste momento, houve um número incalculável de tantos adãos e de tantas evas, nesse derredor, que é o mundo, porém, entre eles, nomes, substantivos próprios se destacaram, e é até cansativo citá-los, mas, tentemos alguns, atendida, obviamente, uma cronológica ordem: caim, abel, matusalém, noé, cam, sem, jafté, abraão, sara, isaque, rebeca, jacó, rúben, simeão, levi, judá, issacar, zebulom, dã, naftali, gad, aser, josé, benjamim, moisés, josué, sansão, samuel, davi, salomão, jó, daniel, ezequiel, isaías, jeremias, oséias, josé, maria, jesus, madalena, mateus, lucas, marcos, joão, paulo, joão batista, pedro, estêvão e…basta, basta, basta. Tanta carne, um monte, uma montanha, sentidos e sentimentos lhes passam, vigorosos, contudo o ilusório dos seus sentidos e sensações, de carne, uma cadeia de “deeneas”, pois, não é ela, nem nunca poderia ser, nem a justiça, nem o amor, esses pilares reveladores do caráter da Divindade, eternos, de sempre, infinitos, sem limites, já que a referência tumular, daqueles, o tempo não apaga, nem mesmo a do expoente, Jesus, nascido em Belém e crescido por um bom tempo em Nazaré, vítima que tem sido do apego de todos nós, mormente de alguns daqueles acima citados que, por olhos de carne, lançam-no em sepulcro, como ideia primaz, necessária, a poder comportar uma ressurreição. Que tristes e infelizes olhos, sentidos e sensações. Porque se enlaçam e se deixam prender, facilmente, no enredo religioso de um re-ligare, que não é nem pode ser desse seu acidental e, sim, do essencial, do Eu! O Eu nesse meu mim, que é coisa, e não pode esse Eu fazer coisa. A coisa, sim, é que, de acidental, pode ganhar emanações de um Eu ressurrecto, isto na linha e linhagem de uma continuidade do céu. E assim é, sem esperadas esperanças, porque, se se espera, se nega, peremptoriamente, o infinito (do que não tem limites), e se nega, igualmente, o eterno (do sempre). Enfim, livre de enganos. Livre de enganos, porque, ora, ora, deixe-se o causal de um porquê nem que seja no casual, merecendo-lhe, tão só, o interesse de carne, esta que é sempre ciosa de um espaço e de um tempo, o (seu) espaço e o (seu) tempo e, se ambos são dela, fique ela com eles e me deixe a mim e a nós, sim, nos deixe, sabido, entretanto, que, para me livrar do engano, preciso sair desse mim e você precisa sair desse si, leitor, leitora e, “navegando águas de espiritualidade”, o Eu, no meu pobre mim, não digo que se sobreleva (o dito Eu), pois isto de se sobrelevar nada de importante importa para Ele; o inconsciente, Nele, é que se casa com o D, da Divindade, e o somatório Dele com o Eu que reside em ti, leitor, que reside em ti, leitora, como assim no todo do conjunto dos vivos deste planeta Terra (e de outras habitadas esferas celestes, se houver) resulta em D-Eus, em D-Eus, em D-Eus!!! Então, longe do engano, o Eu, que em Adão sofreu consequência de desobediência, Ele não cabe em sepulcro do qual possa ressurgir; o ressurgimento é do Eu que, por vontade de Deus, torna-se infenso a influências de carne, salvando-se, ressurrecto, em D-Eus! O Adão do jardim primevo caiu e não saiu da armadilha que lhe impôs a própria carne, com a perda da inocência paradisíaca. Por isso, quem ressurge e ascende ao céu é o Eu, liberto, por vontade de Deus, das influências maléficas da carne. Então, livre de engano, não nos enganem paisagens de nuvens, por exemplo, a registrarem como a passagem de um corpo em suave elevação, não nos enganem, igualmente, a matéria como de um pão e o torpor como de um vinho, que servem, apenas, a evocar a memória de um homem, Jesus. O Eu, Nele, é quem, com o Unigênito Filho de Deus, o Cristo, teve o privilégio de assistir à luta entre o próprio Cristo com o Mal, aquele vencendo a este, e o prendendo, até a consumação do século. Com isto, as influências de carne que é o Mal, vencido este, isola o Eu desse Mal e o Cristo o faz ressurrecto; numa continuidade, portanto, do céu e, à margem, a acidentalidade de carne daquela montanha alhures relacionada.

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