EUS QUE SUPLANTAM TEMPOS E COISAS

EUS QUE SUPLANTAM TEMPOS E COISAS

(Para iniciados e iniciandos, letras mortas para profanos)

(Eclesiastes, Capítulo 3, versículos 1-8) “Tudo tem seu tempo. Há um momento oportuno para cada coisa debaixo do céu: tempo de nascer e tempo de morrer; tempo de plantar e tempo de arrancar o que se plantou; tempo de matar e tempo de curar; tempo de destruir e tempo de construir; tempo de chorar e tempo de rir; tempo de lamentar e tempo de dançar; tempo de espalhar pedras e tempo de as ajuntar; tempo de abraçar e tempo de se afastar dos abraços; tempo de procurar e tempo de perder; tempo de guardar e tempo de jogar fora; tempo de rasgar e tempo de costurar; tempo de calar e tempo de falar; tempo do amor e tempo do ódio; tempo da guerra e tempo da paz”.

O cronista de Eclesiastes fala de tempo e de tempo e de tempo; de tempo do homem, pelo homem e para o homem. Pois as finalidades dos tempos referidos, como são do homem, pelo homem e para o homem, atiçam-lhe, quanto mais e mais se leiam os versículos do Capítulo epigrafado, atiçam-lhe – vínhamos dizendo – a dimensão que lhe é própria de homem, a dimensão de Terra, do barro do qual foi e continua sendo nascido e crescido e crescente. Assim, é de coisas, de algo ligado à Terra que falam os tais versículos; e, tudo isso, debaixo do sol. Impressionam-se tantos e tantos leitores diante desses dizeres, limitam-se ao óbvio colocado pelo cronista, e olvidam-se do que é além e que lhes subjaz em divinal importância. Tem-se, por isso, as atenções para coisas, para o que é essencialmente do mundo. Sim, o Adão e a Eva, barros, com o sopro, a alma; alma que se não tem; alma que se é; esta carne que aqui tecla então é uma alma. Uma alma que lhe é, sem dele ser. Porque essa alma é sopro que se dá e que se tira. E é Deus quem a dá, e é Deus quem a tira; e atira esse homem na cova, quando lhe arrebata esse sopro. Pois é esse homem dotado de alma que tem aquele limite de tempo; tempo para isso, e tempo para aquilo; que monótono! Isso compele à sensação de bocejos intermináveis. Digo-o, nunca para profanos, estes tão afeitos e conformados com tantos limites temporais, coitados. Estes se deleitam com isso. Tudo fazem para conferir importância a esses tempos. Trabalham a oficina deles cuidadosamente; durante todo um curso da vida, não, mas durante todo um curso dos vivos que a vivem provisoriamente, sim. Dizem, arrotando uma (pseudo) sapiência, que o tempo deve ser medido e contado. Nada de desperdícios. O método para um aproveitamento é observado por todos. A hora do almoço, a de dormir e acordar. Em criança, na família, aprende a escovar os dentes. É preciso se cuidar bem para aproveitar o tempo de cada coisa. Mas, uma volta, uma conversão, 180°, faz como Paulo fez, de perseguidor a defensor do Cristianismo, e já então se aponta o armistício celebrado, já sem importância ao tempo e às coisas; estes deixam-se ficar fora, não se submetem a cuidados para que se vejam da porta para dentro, pois importância é exatamente isso. Tempo e coisas permanecem apenas na dimensão do cronista de Eclesiastes. Pois ele não está errado. Apenas trata de algo, coisas e tempos, e nada mais. E que têm a importância deles, não se tem como negar ou esconder. Eles importam, hão de serem colocados porta a dentro, para que tudo transcorra certinho, no dois e dois são quatro da matemática dos homens. Por outro lado, que nem lado pode ser, que o não tem, o divino, na vontade sua, exclusiva, vê essa porta aberta de conversão e já então a carne foge do cenário e o Eu nela residido assiste, do crístico, em 360°, o retorno ao estado belicoso, propósito do anjo caído que, coitado, enfrentando àquele, certa lhe é a condição de prisioneiro até a consumação do século, porquanto a arma do crístico lhe fere a cabeça, mas a sua arma o máximo que pode fazer é apenas ferir calcanhares. Nessa direção, para os tempos e as coisas, direção alguma se tem e se pode assegurar dela, porquanto, pelo divino, amparam-lhe o não-mais-coisa e o não-mais-tempo, em indimensão de eterno e de infinito. E uma alma, em carne e em ossos e em músculos e em nervos, viu com olhos de espírito e, se foi com olhos de espírito, já não era um preso a dimensões de tempo e de coisas. De Nazaré, um homem, nunca por uma vontade sua, viu, em olhos de espírito, o tempo e as coisas tornarem-se a constância sem tempo e sem dimensão de coisa. E essa indimensão como de filho amado, compraz o divino, que é mais do que tempo e é mais do que coisas. E só e somente por vontade dele é que o eu residido no mim do cronista deste magro texto mas tão musculoso contexto há de, em vontade anulada sua, ou seja, deste reles cronista, ater-se às ocupações e preocupações de Eclesiastes, sem o desmedido apego que eles sugerem à primeira vista.

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